Como é viajar para Amazônia com a Caboclos – Relato de uma Viajante

Esse texto foi gentilmente escrito pela Ana Carolina, que esteve na Caboclos em agosto de 2019. Gostou tanto que decidiu compartilhar um pouco da experiência dela com você, que está decidindo se essa viagem é a sua cara. 🙂

Sou uma pessoa muito ligada à natureza e impressionada com sua abundância e ciclos. Naturalmente, a Floresta Amazônica sempre esteve no meu imaginário. No último mês de agosto pude realizar o desejo não apenas de conhecer mas, especialmente, vivenciar a experiência de estar cercada pela floresta, compartilhando toda sua beleza e energia, guiada pelos saberes e histórias de uma comunidade de ribeirinhos que, com muito zelo, toca a Caboclos House.

A decisão pela Caboclos

Há diferentes tipos de vivências à disposição dos turistas que querem conhecer a região amazônica, do luxo ao turismo mais “raiz”, porém com conforto, sendo este o que eu e meu companheiro Daniel sempre buscamos em nossas viagens. Pesquisamos pela hashtag #pousadadeselva e encontramos uma citação à @cablocoshouse. Um clique no site e eu já estava decidida: a lista de experiências possíveis, a carta de apresentação e o excelente custo benefício dos pacotes completos nos ganharam de cara! Não é preciso se preocupar com nada além da escolha dos passeios que se tem interesse. Todo o atendimento foi realizado por e-mail de forma simpática e eficiente. Fechamos o pacote de 3 dias e 2 noites  para 2 pessoas, em quarto privativo.

A chegada no hotel de selva

O transfer nos buscou de manhã no hotel em Manaus, para que pudéssemos aproveitar bem o primeiro dia.  O trajeto levou 1h de carro, passando pela ponte que cruza o Rio Negro, até um local onde pegamos uma lancha e subimos o rio  por cerca de 50 minutos. Já nesse momento começa a imersão na experiência da floresta. Chegamos na Caboclos, que fica na região do Lago de Acajatuba, e fomos recepcionados pela Nilde (dona da pousada), com um refrescante suco de taperebá (espécie de cajá). Toda a estrutura do local é de madeira e fica suspensa devido ao aumento do nível do rio em épocas de cheia. Fomos em agosto, período que o rio está começando a baixar. Chegamos, nos acomodamos no quarto (bem espaçoso) e fui me refrescar na piscina da pousada, com água bombeada do rio, mas tratada. Logo o almoço ficou pronto, com minha opção vegetariana – eles perguntam de restrições alimentares na ficha de cadastro.

Canoagem pelos igarapés

O primeiro passeio, assim que o calor deu uma amenizada, foi a canoagem pelos igarapés. Fomos até o local de lancha, rebocando as canoas. Todos com coletes salva-vida e a lancha acompanhando para dar apoio. O passeio é divertido (mesmo pra quem nunca fez nada parecido) e lindo! Dá pra ver de perto as copas das árvores cujos troncos ainda estão submersos nessa época e, com sorte, é possível ver alguns animais. No fim tive que ser “rebocada” porque haja braço!

Pôr do sol no flutuante

Em seguida fomos ver o pôr do sol num flutuante, que também é de familiares da Nilde (achamos muito legal o fato da Caboclos ser um negócio familiar, onde a Nilde emprega filhas, irmãos, mãe, tios…). Notei que a maioria das pessoas que chegou ali para ver o pôr do sol eram europeias. O pôr do sol foi um espetáculo, e fiquei nadando até  quase anoitecer, quando começou a famosa chuva amazônica e voltamos pra pousada.  Depois do jantar, meu parceiro Daniel foi na focagem de jacarés, que é feita sem manipular os filhotes para não perturbá-los!

Nascer do sol no Rio Negro

Depois de uma confortável noite de sono, madrugamos para o primeiro passeio do dia: ver o sol nascer. Tudo ainda escuro e todo o espaço preenchido pelos sons da floresta. Fomos com as luzes dos celulares para a lancha, que nos levou a um ponto estratégico do Lago de Acajatuba. A lua ainda estava alta. Os pássaros, os peixes, os botos, fomos vendo todos “acordarem” junto aos primeiros raios de luz. O sol em si demorou a sair, mas surgiu majestoso e laranja, exatamente atrás de onde fica a pousada, por cima do “skyline” de árvores. Ficamos admirando o degradê laranja enquanto outros barcos iam se chegando para o que parecia ser o melhor lugar pra essa observação.

Conhecendo uma comunidade ribeirinha

De volta à pousada, tomamos o café da manhã com opções tradicionais e  regionais –  batata doce, mandioca cozida e banana frita foram novidades nessa refeição para mim, e adorei! Voltamos a atravessar o Rio Negro de lancha para conhecer a vila Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, onde mora a maioria das famílias ribeirinhas da região. O lugar foi cenário da novela “A força do Querer”, na trama se chamava Parazinho (apesar de ficar no Amazonas). Um charme de vila: tem a igreja, casinhas coloridas de madeira, espaço de eventos, unidade de saúde, escola e o centro de artesanato, onde pudemos ver um pouco do trabalho de bijuterias de sementes e de marcenaria. Tive contato com a fruta do Urucum direto no pé e como sua polpa produz o famoso pigmento usado pelos índios e pela indústria de cosméticos.

Interação com botos cor de rosa

Depois fomos para a experiência com botos. Estava preocupada de que essa interação fosse ruim para os bichos, mas gostei da maneira como é feito. Ficamos em uma plataforma com o corpo submerso até pouco acima da cintura, usando coletes, num flutuante no meio do lago. Um rapaz (nascido e criado na região) é o único que pode alimentar os bichos e o local não funciona todos os dias (pra que eles não deixem seu instinto natural de pesca).

Ele bate a mão na água pra atraí-los (os botos ficam soltos, não é um aquário ou nada do tipo) e aos poucos eles vão aparecendo. Ele dá os peixes que estão em um balde de um por um e, enquanto o boto pula pra pegar, somos autorizados a passar a mão na barriga e pescoço deles. Eles têm uma textura muito diferente, meio gelatinosa e fofa ao mesmo tempo. Confesso que fiquei tensa porque foram chegando muitos, nos cercando. Mas eles são uns amores de fofos! Os cor de rosa é que são sociáveis, os cinza são mais ariscos e não se aproximam.

Lá tem também um tanque bem fundo com Pirarucus, o peixe mais famoso da região, quem quiser pode alimentá-los com uma vara pra vê-los pulando. São gigantes!

Oficina de sabonetes, tapioca raíz e xarope natural

De volta à pousada, fui fazer uma oficina de sabonetes naturais, ministrada pela cunhada da Nilde, cuja casa fica ali no espaço da Caboclos. Ela aprendeu a atividade com voluntários e agora faz sabonetes com óleos extraídos por ela mesma da floresta e essências naturais, além de cremes a base de castanhas e outros frutos da região. Fiz alguns sabonetes glicerinados e fiquei com dois deles, um de açaí e outro com pó da árvore de mulateiro, um rejuvenescedor natural. Saí da oficina ainda a tempo de pegar um pouco da aula que a mãe da Nilde deu ensinando a fazer um super xarope pra gripe e goma de tapioca, mostrando o processo com a mandioca desde o início. É o que eles chamam de “casa da farinha” e também fica na área da pousada. A tapioca feita por ela ali na hora, com um pouco de sal e pedaços de castanha do Brasil, foi das coisas mais gostosas que já comi!

Praia de rio

Almoçamos, esperamos o sol baixar um pouco descansando no redário e fomos conhecer a Praia do Davi. Chegamos a uma pequena faixa de areia, onde meninos jogavam bola e depois se refrescavam no rio. No chamado verão amazônico, quando chove menos, o barqueiro explicou que a faixa de areia fica enorme e entra metros e metros rio adentro. Inclusive, dizem que visitar a Amazônia nos 2 períodos (chuva e seca) são 2 experiências totalmente diferentes. Agosto o rio estava começando a baixar.

Enquanto nadávamos ali no rasinho, bebendo uma cervejinha levada no barco, notamos um movimento na água. Suspeitando ser um boto, batemos a mão na água, como aprendemos antes e PIMBA: o bicho veio basicamente no nosso joelho!! Foi um dos momentos mais mágicos da viagem! Aí chegaram mais uns 3, e mesmo sem termos nada de comida pra dar pra eles, ficaram uns 10 minutos indo e vindo, coisa mais linda e inesquecível.

Trilha pela selva e saberes amazônicos

No terceiro e último dia na Caboclos, fomos fazer uma trilha na floresta. Fomos de lancha com nosso guia (parceiro da Nilde) até um ponto mais afastado da pousada. Durante todo o caminho ele foi nos mostrando as árvores, os caules, as diferentes propriedades medicinais/cosméticas, os cheiros, os gostos das castanhas e algumas folhas. Contou lendas da região, ensinou a trabalhar com determinadas folhas usadas por eles e pelos indígenas. Uma verdadeira imersão, como sempre sonhei!

Em determinado momento chegamos a passar por trechos de mata fechada, que ele ia abrindo aos poucos com um facão. Por isso recomendo que o passeio seja feito com tênis e calça, pra evitar arranhões dos galhos e folhas. Água também é muito importante, porque na floresta o calor é ainda mais intenso! Vimos macacos, ouvimos cantos de pássaros e voltamos maravilhados para a pousada, para almoçar e descansar até o momento que o transfer nos levaria de volta a Manaus, no fim da tarde.

O único porém de toda essa experiência foi que não realizei meu sonho de ver um bicho-preguiça solto na mata, mas isso foi apenas um detalhe diante de tanta beleza vista e vivenciada nesses dias. Muita coisa para processar (um mês depois ainda sinto esse êxtase ao escrever esse relato) e a certeza ainda mais reforçada de que a Amazônia é um tesouro a ser preservado, de que a melhor opção para se conhecer um lugar é vivenciá-lo com gente dali mesmo e que o brasileiro precisa conhecer e apreciar melhor tanta riqueza natural!

Ana Carolina Castro – Goiana que mora no Rio de Janeiro, jornalista e servidora pública, apaixonada por destinos conectados à natureza